LENDA URBANA - TRÊS [Parte 1]


Tive a impressão que as aulas demorara uma eternidade para passar hoje, mas finalmente o sinal soou encerrando por hoje. Os meus colegas faziam um barulho enorme para guardar seus materiais e saírem da sala: zíper fechando a mochila, cadeira sendo arrastada, passos apressados em direção à saída. Eu fechei meu caderno e me virei para pegar a mochila quando um engraçadinho bateu na minha mesa e derrubou meu estojo espalhando todos meus lápis e canetas, “Desculpa!” ele disse sem nem me olhar direito e saiu correndo. Só estava eu e o professor, ele pegou a maleta e disse para eu não demorar que ele já estava saindo. Afirmei com a cabeça e me ajoelhei para recolher todas as canetas e lápis espalhados e um caiu embaixo do armário onde os professores guardam os materiais.
Já tinha recolhido todos e faltava aquele debaixo do armário, estiquei o quanto podia para alcança-lo, quando de repente a luz apagou.
-Hey!
Eu abandonei o lápis ali embaixo e saí o mais rápido da sala, todas as salas já estavam com as luzes apagadas e então as luzes do corredor começaram a se apagar também. “Droga!”. Eu comecei a correr em direção à escada, as luzes do térreo ainda estavam acesas, mas quando estava apenas na metade das escadas as luzes se apagaram. Ainda conseguia enxergar porque as luzes externas estavam acesas, fui em direção ao portão principal e tentei abri-lo, mas já estava trancado.
-Como eles puderam ser tão irresponsável de nem verificar se havia alguém na escola? – peguei meu celular e por ironia estava sem sinal – Ótimo!
Já que vou passar a noite na escola, melhor procurar um lugar confortável para dormir, meus pais vão ficar preocupados, mas amanhã explico o que aconteceu. Meu celular estava sem sinal mas servia para iluminar o caminho, no final do corredor, oposto ao portão de saída e entrada tinha uma luz acesa e vi um vulto passando por lá. Estranho. Fui apressada até lá, talvez fosse alguém que ainda estava fechando a escola, mas quando cheguei aonde estava iluminado, era apenas uma sala vazia, com uma mesa e uma máquina de escrever. Que coisa antiga, e eu adoro coisa antiga. Rapidamente fui até a mesa e comecei a examinar a máquina, tinha esquecido a raiva que estava por estar presa na escola e com fome.
Sentei de maneira confortável e comecei a digitar ansiosa, qualquer coisa, eu só queria sentir o prazer de apertar aquelas teclas:
“A garota nerd que adora livros de ficção se tornou a mais popular do colégio. Todos queriam falar com ela, e todos queriam dicas de livros.”
“Karoline, a garota mais insuportável ficou careca e aprendeu a nunca mais desprezar as pessoas por seus estilos”
“Willian finalmente percebeu que Karoline era uma besta e percebeu que eu sou a garota mais fantástica para namorar”
Ri ao escrever essas coisas tão infantis, mas que no meu interior era o que eu realmente desejava. Mas era claro que isso eram só palavras em um papel. Estava ficando realmente entediada, escrevi por fim:
“Mas nada disso importa, porque todos vamos para o vazio do nada, e essa escola explode e ninguém é mais ninguém.”
Descansei minha cabeça sobre meus braços e fechei os olhos. Percebi alguém me chamando:
-Ei garota, o que está fazendo aqui?
Era o inspetor. Eu estava com uma dor enorme no pescoço e na coluna. Eu dormi?
-Daqui a pouco vai bater o sinal. Como você entrou aqui antes dos outros?
Já tinha amanhecido? Nem percebi que tinha dormido ali. Respondi que fiquei trancada no dia anterior, mas ele nem prestou atenção no que eu disse, ele não estava realmente interessado. Só perguntou porque era o protocolo.
Eu estava com muitas dores dessa noite mal dormida, vou aproveitar enquanto todos estiverem entrando na escola e vou sair discretamente. Preciso ir para casa explicar aos meus pais onde passei a noite e também dormir de um jeito mais confortável.
Segui o inspetor até o portão, ele abriu e me olhou desconfiado. Era dever dele me manter na escola, mas ele não estava nenhum pouco afim de ficar atrás de mim. Aquele olhar era para que eu não fosse embora, mas que isso ficava a critério da minha consciência. Estava esperando ele se distrair para eu poder sair o mais rápido dali, quando um aluno que nunca tinha visto sorriu para mim. Sorri de volta por reflexo. Quando estava pronta para sair novamente, dois alunos passaram por mim e acenaram. Interrompi minha fuga novamente e acenei de volta. Que estranho, por que eles estão falando comigo?
Agora era o momento, saí e estava descendo as escadas externas quando três meninas me chamaram:
-Oi Aline!
Olhei desconfiada e vacilei ao cumprimenta-las. Elas sabiam meu nome, mas eu não sabia os delas.
Continuei descendo as escadas e agora um grupo de meninos, falaram comigo:
-Salve Aline! Depois a gente pode conversar sobre aquele livro lançamento?
Gaguejando respondi que sim. Quando finalmente terminei de descer as escadas, duas garotas e um menino me seguraram pelo braço:
-Onde vai Aline? Você não é de matar aula.
-Hoje temos aula de literatura!
Esses três eu conhecia, era da minha turma, mas estavam longe de serem meus amigos. Era apenas uma turminha popular.
-Ah! Claro eu estou indo para sala.
Resumindo esse dia estranho, acabei não indo para casa naquele momento e passei o dia com aquele grupo que pelo visto eram meus novos amigos. Toda vez que passava no corredor, alguém me cumprimentava, ora dizendo meu nome, ora acenando, ou até mesmo apenas sorrindo. Mas todos me olhavam e todos me conheciam. Estava até sendo bom essa popularidade.
No final das aulas, voltei para casa falei com meus pais bem a tempo, eles estavam quase ligando para a polícia. Brigaram comigo por eu ser tão distraída, mas ficou tudo bem. E finalmente dormi na minha cama confortável.

Continua...

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