Conto: LENTAMENTE... FIM


Voltei a consciência e antes de abrir os olhos senti um calor forte sobre minhas costas, eu estou sobre algo duro. Era o chão. Tinha areia. Eu ainda não consegui abrir os olhos, está muito claro e o pouco que abro, arde minha retina. Não ouço nada, apenas pios distantes de alguma ave de rapina. Está muito quente, sento escorrer na minha testa o suor. Consegui mexer meus braços e apoio no chão, machuca um pouco por causa da areia e estou tentando me suspender. Meu olho se acostuma um pouco com a claridade e consigo abri-lo um pouco, vejo tudo marrom, laranja, amarelo, apenas distingo esses tons de cores, mas não consigo distinguir o lugar onde estou. Estou fraco e deito novamente, não sei por quanto tempo.

Minhas costas nuas começaram a arder, eu preciso mudar minha posição, eu viro subitamente e fico de barriga para cima, minhas costas ardem por causa da queimadura em contato com a areia. Ainda não consegui abrir os olhos completamente, mas já sei o que causou as queimaduras: o sol. E agora ele vai queimar meu rosto. Está muito abafado e quente, não sinto uma brisa, nenhum pouco de ar. Preciso me levantar ou entrarei em combustão de tão quente. Todo meu corpo dói, mas a necessidade de sair daqui é maior do que minhas dores.
Levanto de uma vez, sem cerimônia, estou muito fraco e minhas pernas quase não me sustentam, cambaleio, mas consigo ficar firme. Quando finalmente fico parado, coloco minha mão sobre a fronte para diminuir a claridade e eu conseguir abrir os olhos de vez. Alguns segundos depois eu consigo olhar o lugar: há muita terra seca, alguns cactos distantes um do outro e o sol a pino sobre minha cabeça. Não sei quantos graus está a temperatura, mas sei que ficarei desidratado em breve, estou suando muito.
Eu olho para meu corpo, estou apenas com um calção. Vejo hematomas no meu abdômen e em minhas pernas. Nos meus braços há alguns cortes, mas o sangue está seco. De repente sinto uma forte dor de cabeça. Meus pés estão descalços e sujos. Vejo que no chão há marcas de pneus. Acho que algum me trouxe aqui. Me sinto tonto, fecho os olhos e cambaleio novamente. Preciso sair daqui, esse silêncio está me enlouquecendo. Não sei por onde ir. Mais uma vez o pio da ave. Sigo em frente.

Estou sedento, o tempo parece que parou, enquanto a mim, parece que não saí do lugar. Andei e continuo vendo a mesma coisa, o sol não dá trégua, minha garganta até arde, meus ombros também, o sol queimou. A paisagem até treme, o calor está deixando minha visão turva. Nenhum barulho. Nenhuma vida.
Apenas esse clima e vegetação árida, não consigo lembrar de nada antes daqui, apenas algumas vozes debochadas e alguns gritos nervosos. O clima está muito abafado, é como se tivessem tirado todo oxigênio do ambiente. Nenhum som, esse silêncio está me matando psicologicamente. Minha garganta arde e tento sem sucesso umedecer com saliva, porém dói ainda mais. O sol não dá trégua. Meus ombros ardem na carne viva, já nem sinto meus pés, estou andando no automático. O que fiz para estar aqui? Será que aqui é o inferno? Ando, ando e não chego a lugar algum.
Não senti minhas pernas e me vejo no chão, já não sinto meu corpo, apenas todo meu líquido evaporando, meus olhos se fecharam e não tenho força para abri-los. Minha boca não fecha, é como se pedisse desesperadamente por água, não consigo mexer nem mais o dedo.

Estou ali, estirado no chão, com a boca aberta e os olhos fechados. Sem ouvir nada, sem sentir nada, nem mais a dor da queimadura, parece que atingiu um nível que não queimar o sistema nervoso, não vejo mais nada. Fui deixado ali para morrer. Por quê? Por quem? Até que meu pulmão não consegue mais puxar o ar e tudo deixou de existir...


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